A importância da reabilitação no AVC

Renato Nunes
28/03/24
A importância da reabilitação no AVC

Leia o artigo de opinião da autoria de Renato Nunes, médico Fisiatra/Medicina Física e de Reabilitação, da Associação Portuguesa de Medicina Física e Reabilitação (APMFR), sobre o papel da reabilitação, feita por profissionais habilitados, na recuperção das pessoas que sofreram um AVC. "A reabilitação dos sobreviventes de AVC deve ser orientada por equipas multiprofissionais coordenadas por médico especialista em Medicina Física e de Reabilitação e devem incluir todos os profissionais (terapeuta da fala, terapeuta ocupacional, fisioterapeuta, enfermeiro de reabilitação, neuropsicólogo, nutricionista, assistente social, médico fisiatra)", salienta. 

O acidente vascular cerebral (AVC) é uma das principais causas de incapacidade permanente do adulto. Há cerca de 20 mil novos sobreviventes de AVC por ano em Portugal, dos quais 35-40 % necessitam de programas de reabilitação especializados, em que a precocidade, a intensidade e a especialização são determinantes para o sucesso da intervenção terapêutica.  

O European Stroke Action Plan 2018-2030 identificou metas globais até 2030 para implementar um plano de abordagem do AVC em todos os países europeus, com medidas que visam controlar a sua incidência, prevalência e a suas consequências. Estas metas são estabelecidas para a prevenção primária, para o tratamento de fase aguda, para a reabilitação em todas as fases temporais e para as questões relacionadas com a vida pós-AVC.  

Os sobreviventes de AVC podem apresentar alterações em qualquer domínio das funções e estruturas corporais, assim como da sua autonomia e funcionalidade, nomeadamente alterações motoras, cognitivas, da comunicação, da deglutição, sensoriais e da função vesico-esfincteriana. 

Assiste-se nos últimos 30 anos a uma mudança do paradigma da reabilitação, orientada tradicionalmente para os défices relacionados com a mobilidade e função neuromotora, associado atualmente a uma valorização crescente de áreas relacionadas com o funcionamento cognitivo, psicoemocional e comportamental. As alterações cognitivas são frequentes após AVC, com uma incidência de 40-80%, contribuindo de forma significativa para aumentar a complexidade dos quadros funcionais, agravados por sequelas em múltiplos domínios. No âmbito das alterações neuropsicológicas, as alterações psicoemocionais, em especial a depressão, são também frequentes e com impacto potencial no funcionamento cognitivo e na recuperação de vários domínios.  

O reconhecimento do efeito das consequências da doença no prognóstico funcional é a base do modelo biopsicossocial (Classificação Internacional de Funcionalidade, WHO, 2001), em que se valoriza a atividade funcional e a sua tradução na participação ativa nos domínios da vida na comunidade.

A reabilitação dos sobreviventes de AVC deve ser orientada por equipas multiprofissionais coordenadas por médico especialista em Medicina Física e de Reabilitação e devem incluir todos os profissionais (terapeuta da fala, terapeuta ocupacional, fisioterapeuta, enfermeiro de reabilitação, neuropsicólogo, nutricionista, assistente social, médico fisiatra). Estes cuidados devem estar organizados desde a fase aguda, com cuidados de reabilitação desde o primeiro dia.

As equipas são responsáveis por definir o circuito do sobrevivente de AVC, o seu destino após a alta, a transição de cuidados, a tipologia mais adequada para a gravidade e quadro clínico e garantir a continuidade de cuidados até ao regresso à comunidade.  Cada doente deve ser submetido a um programa de reabilitação individual elaborado por uma equipa multiprofissional de reabilitação, tendo em conta a avaliação clínica, a avaliação funcional e a gravidade, orientado para objetivos definidos específicos, mensuráveis, realistas e atingíveis em tempo determinado, abrangente e de intensidade e valências terapêuticas indicadas em cada caso. 

O acesso à reabilitação constitui um direito humano fundamental, que é consagrado pela Carta das Nações Unidas e pela resolução da Assembleia Mundial da Saúde de 2005, e deve estar garantido para todos os sobreviventes de AVC. 

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