O impacto da COVID-19 na Oncologia: a nova realidade

13/01/21
O impacto da COVID-19 na Oncologia: a nova realidade

A crise pandémica surtiu consequências diretas nos cuidados de saúde, uma vez que estes foram obrigados a mudar as suas prioridades na atividade clínica, obrigando ao cancelamento de consultas e exames e até mesmo à suspensão da atividade clínica de várias especialidades. A News Farma conversou com a presidente da Sociedade Portuguesa de Oncologia (SPO), Dr.ª Ana Raimundo, que identifica os principais efeitos da pandemia na área oncológica. Leia a entrevista na íntegra.

News Farma (NF) | Qual o impacto da pandemia na área oncológica?

Dr.ª Ana Raimundo (AR) | Os diversos serviços que abrangem os tratamentos e as consultas continuam por todos o país. No entanto, o que se verifica, neste momento, é que uma percentagem significativa de doentes apresenta uma doença oncológica mais avançada, efeito do tempo de espera ou a impossibilidade de aceder ao médico assistente. Registaram-se atrasos nos meios complementares de diagnóstico, portanto já sentimos algum atraso no diagnóstico precoce.

NF | É possível ter noção do número de tratamento e consultas que ficaram atrasos?

AR | Números é difícil termos, mas sabemos que existem algumas consultas e meios complementares de diagnósticos que foram adiadas, ou substituídas por teleconsultas.

NF | É possível que exista um elevado número de diagnósticos por realizar?

AR | Os centros de saúde, os Cuidados de Saúde Primários e os médicos de família estão, neste momento, muito ocupados com o apoio à COVID-19, havendo uma redução significativa das consultas, bem como pessoas que simplesmente não conseguem marcar consulta com os médicos de família. Isso faz com que os doentes, quando surgem os primeiros sintomas, não sejam vistos, agravando o estado das doenças. Além disso, temos de nos lembrar que houve uma redução drástica do rastreio. Sabemos que rastreios do cancro da mama, do colo do útero e cólon, que são realizados maioritariamente em centros de saúde, não estão a ser feitos, pelo que há uma grande falha de diagnósticos, ficando cancros em estadios iniciais por diagnosticar.

NF | Na fase mais calma da pandemia foi possível haver alguma retoma desses rastreios?

AR | Foi retomado o rastreio do cancro da mama, com todos os cuidados de proteção, mas, claro, num número inferior ao que se realizavam. Agora os cancros do colo do útero e do cólon, que são feitos nos centros de saúde, continuam suspensos, devido à sobrecarga dos mesmos.

NF | Qual é a maior preocupação para o futuro?

AR| A preocupação é que se continuem a fazer diagnósticos tardios da doença. O que faz com a probabilidade de cura seja menor, que os doentes tenham de ser submetidos a tratamentos mais longos, complexos, caros e com mais sofrimento para o doente e que daqui a quatro/cinco anos se venha a verificar um aumento das taxas de mortalidade de cancro.

NF | O que gostaria de ver de diferente para reduzir o impacto da pandemia a médio longo prazo?

AR | Os Cuidados de Saúde Primários deviam ficar mais libertos para que os médicos de família consigam prestar apoio e consultas aos seus doentes. Penso que, havendo essa possibilidade, conseguimos estar ainda a tempo de recuperar o mais cedo possível este atraso. Temos de continuar a prestar apoio às populações, devido à COVID-19 obviamente, mas não nos podemos esquecer das outras doenças que matam mais e que irão continuar após a pandemia passar, onde não é possível haver uma cura imediata, sendo necessário continuarmos a fazer os rastreios e o diagnóstico precoce, áreas onde é necessário investir para que não hajam tantas consequências desses atrasos.

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