A planta da canábis é constituída por mais de uma centena de diferentes fitocanabinóides (compostos produzidos pela planta da canábis e que se encontram em elevadas concentrações na flor), sendo que o delta-9-tetrahidrocanabinol (THC) e o canabidiol (CBD), são os dois principais canabinóides da planta. Para além disso, ela é ainda constituída por terpenóides e flavonóides. A identificação e isolamento do THC e do CBD (década de 60 e de 40, respetivamente), levaram ao desenvolvimento de novas pesquisas científicas, que recaíam essencialmente sobre o estudo do THC. Para além da sua obtenção a partir da canábis, o THC pode também ser sintetizado quimicamente em laboratório.
Em Portugal a utilização da canábis para fins medicinais está aprovada desde 2019. De acordo com a Deliberação nº11/CD/2019, do Infarmed, a utilização de canabinóides para fins medicinais está aprova em sete indicações:
- Espasticidade associada à esclerose múltipla ou lesões da espinal medula;
- Náuseas, vómitos (resultante da quimioterapia, radioterapia e terapia combinada de HIV e medicação para hepatite C);
- Estimulação do apetite nos cuidados paliativos de doentes sujeitos a tratamentos oncológicos ou com SIDA;
- Dor crónica (associada a doenças oncológicas ou ao sistema nervoso, como por exemplo na dor neuropática causada por lesão de um nervo, dor do membro fantasma, nevralgia do trigémio ou após herpes zoster);
- Síndrome de Gilles de la Tourette;
- Epilepsia e tratamento de transtornos convulsivos graves na infância, tais como as síndromes de Dravet e Lennox-Gastaut;
- Glaucoma resistente à terapêutica.
A legislação aprovada determina que a utilização destas terapêuticas está sujeita a receita médica obrigatória sendo a sua dispensa exclusiva em farmácia.
Tendo em conta a evidência cientifica disponível à data de hoje, a Federação Europeia da Dor (EFIC), reconhece os potenciais benefícios do uso de canabinóides no tratamento da dor neuropática (a dor neuropática é uma dor crónica ou prolongada que surge como resultado de uma lesão nervosa e afeta milhões de pessoas em todo o mundo.) e no tratamento da dor oncológica quando a componente neuropática é predominante.
Dito isto, os canabinóides podem de facto ser uma nova arma no tratamento da dor crónica, área onde muitas das vezes as terapêuticas de que dispomos não controlam satisfatoriamente a sintomatologia dos nossos doentes.
Até à data, ainda não existem preparações e substâncias à base de canábis para fins medicinais aprovadas pelo Infarmed, facto que nos impossibilita de aceder a potenciais alternativas para o tratamento das pessoas com dor crónica em Portugal.
Como médicos, aguardamos esta aprovação por parte do Infarmed, bem como o acesso a informação e formação contínua por parte da Ordem dos Médicos, assegurando a sua correta prescrição.